Sobre futebol (uma das coisas mais importantes entre as menos importantes) e sobre um muro de Santa Luzia (MG) onde se podia subir e escrever o que quisesse.
Que tipo de gigantes somos debaixo de todas as coisas?
Do divino ao descartável.
Nos desalentos e alegrias a dose certa...
O que devemos rebater?
Nos clarões de certeza, o tamanho de nossa sombra.
Qual a magnitude das dúvidas afrontando nossa estatura?
O que podemos olhar por cima e para quais milagres devemos saber nos curvar.
_ Eu mesmo queria que o tudo nos fosse caro demais para podermos enxergar. Do contrário, gratuito o saber de tudo.
Em cada esquina há um amante enganado.
Nos ônibus e nas lojas.
Um ser pensante pensando ser maior do que é.
Haverá o tolo que jamais saberá o quanto é valioso.
Nesse intervalo de tempo chamado vida.
Deve existir uma referência...
Para evitarmos essa mediana.
No espaço, no tempo e nos convívios.
A métrica das circunstâncias que nos limita.
_ Enquanto uma moça bonita ou o sorriso da infância nos absorve. Outrora um estúpido nos exorta.
O quanto sentir em tudo ou em cada momento.
Qual deve ser a sede ou a fome?
Quais as doses devidas de sofrer ou de prazer.
Na topologia do desconhecido que nos contém.
Uma senhora de minha infância anda se esquecendo das coisas.
Tem se esquecido de andar.
Dos aniversários dos amigos e parentes.
Senhas, endereços e quantias são, agora, inacessíveis.
Às vezes se lembra das pessoas.
De onde fica a padaria.
Mas só do caminho de ida, não o da volta.
Volta e meia se esquece dos malditos e infinitos degraus.
Todos os dias ela sorri, religiosamente.
E conta alegre sobre uma grande habilidade que desenvolveu.
A de esquecer todas as mágoas e arrependimentos.
Toda manhã é um novo mundo...
Há apenas o agora.
Orgulhosa por ter alcançado o conselho de todos os gurus.
Mata de inveja a todos.
E vive apenas o agora...
Disse sobre o poder de não mais inventar desculpas nos esquecimentos.
Já que muitos eram apenas descaso com gente incoveniente e chata.
Todos os dias se apresenta aos conhecidos de ontem.
Meros desconhecidos de amanhã...
Em alguns momentos tudo volta a funcionar.
Banhada de lucidez uma lágrima corre em sua face.
Então ela diz que devo deixar minhas angústias pra lá.
Esquecê-las...
Diz que o ato de esquecer é sempre.
Como o dinheiro, a razão ou o fio dental.
Pois usamos vida inteira, todos os dias, da maneira errada.
Pergunto então sobre como esquecer direito, mas ela não se lembra mais...
Eu me despeço e ela pergunta meu nome e destino.
Elogia o nome, novamente.
Antes de dizer para onde vou.
Ela interrompe:
_ Agora, para onde vai não precisa dizer. O que importa? Apenas não se esqueça de aproveitar o caminho. É só o que nos resta...
A tarde sorria quente e amarela.
Todos nós, como sempre.
Reunidos e animados, sempre.
As pernas prontas para correr.
Eu e meus amigos na pelada de nossa rua turca.
Não sabíamos que era nossa última pelada.
Jogamos felizes, velozes e zangados...
Como sempre.
Despedimos nossa tristeza brincando, como nunca.
Pois nunca mais estaríamos ali.
Uma tarde de dia qualquer assistiu à última intensa pelada da minha turma em nossa rua.
A vida não avisa a vida...
Pelo menos ninguém chorou, pois não sabíamos.
Não sabíamos o que a vida nos preparava naquele dia de fim.
E a bola não mais bateu o muro tilintando.
Os carros, nossos piores adversários, não atrapalharam mais os lances.
Pare bola! Não mais se gritou...
Eu nunca havia pensado que chegaria o último dia em que a rua seria um Mineirão.
Mesmo estando lá a rua, nós não estaremos.
E nós todos moleques finados em homens.
Sim, teve mesmo um dia que sobraria apenas na memória nossos gols.
Como um vídeo envelhecido da copa de 70.
Num dia que ninguém sabe quando foi.
Nasci,
fui criado e a cada dia sou mais curtido em Belo Horizonte. Por isso, uma das
coisas que mais fiz na vida foi enfrentar os morros desta cidade. Aos moradores
de cá a bravura na luta contra os morros é necessária e não facultativa. As
regiões planas me causam certo desconforto. O único plano que gosto é o formado
pelas águas da Pampulha, mas gosto porque rapidamente ele se torna uma queda
brusca no sumidouro da barragem e se desprende mundo afora. As faltas de horizonte
acima do nariz e de inclinação diante da fronte me causam uma desmineirização.
Por
falar, desmineirar é a coisa mais preocupante que tenho visto nestes tempos de
vida. Não sou do cerrado e nem sertanejo, mas rogo aos céus que me protejam da
pasteurização dos dias. Da planificação de comportamento de agora, pois aí está
entre todos o plano que menos me agrada. O plano do pensamento podado. Cá eu,
gosto do belorizontino da roça, que em contra-senso é a amálgama do
comportamento urbano e da singeleza do povo da roça. Com a dureza dos asfaltos
e a clareza dos roça para ver as coisas. E se digo tudo isso é porque nasci,
fui criado e a cada dia que passa mais curtido nesta topografia acidentada..
Aqui,
onde considero a confluência de todas as mineiridades. No estado que é o centro
de gravidade do Brasil. Eu posso ver as luzes brilhando acima do céu e piscando
abaixo da terra. E se a todos aprendi receber bem é pelo o orgulho de ser o
para-raio dos de fora. Assim sei o segredo de se pensar em nunca querer daqui
sair. Nessas inclinações de embreagens desgastadas. A cidade é da minha
família, com ela tenho laços de sangue e amor. Subo Bahia e desço Floresta. Como
dito, isso só porque nasci, fui criado e a cada dia sou mais curtido nos
meandros das infinitas conversas de bares.
Vejo
intenções claras de se valorizar minha cidade com citações aos seus pontos
marcantes e ao nosso comportamento particular. Ao mercado, às praças, ao pão de
queijo e a um tal prédio que balançava, mas não caía e por fim, assim como nós,
está de pé num desses morros. Na tentativa de resgatar a identidade que anda
se esvaindo com o tempo. Pois por mim, que me garanto no que digo por só dizer
aqui o que há em minha existência, não precisam se preocupar. Em cada canto que
vou levo meu jeito destilado e a saudade da temperatura amena de nossas noites.
Afirmo isso porque nasci, fui criado e a cada dia mais curtido nas raízes da
serra imponente que se alteia ao nosso sul.
Vou reproduzir alguns trechos de
conversas que aconteciam depois da pelada na rua onde fui criado. Vou ocultar o
nome dos agentes em respeito à história.
Naquela época era normal a gente
parar de jogar bola por volta das 20 horas e depois começar a conversar sentado
em algum meio fio ou passeio. Um bando de meninos conversando até tarde na rua,
nada mais. Lembrando que antes 10 horas da noite era tarde demais e o mundo já
estava paralisado.
Nessas conversas pós-pelada
ouvia-se de tudo, inclusive futebol. Porém, havia um tema que surgia e até o clima mudava.
Era quando o papo ia para o lado do sobrenatural, a coisa ficava séria.
Na discussão sobre os espíritos e
sua existência não faltavam casos contados de experiências pessoais e de
terceiros. Claro que nenhuma delas poderia ser comprovada, mas todos já tinham
de alguma maneira sido incomodado pelas almas do além.
Um falava de coisas do interior
citando as tais mala-sombras que me causava arrepios, outro dizia sobre uma tia
que fora possuída e só se libertara após uma sessão de descarrego com muita
reza e tapa na cara. Dessa eu me lembro até do diálogo:
_ Sai coisa ruim em nome de Jesus
nosso senhor!!! Disse o exorcista com uma série de pancadas e puxões de cabelo
na possuída.
Segundo o garoto, depois de umas
quatro horas a entidade disse com uma voz rouca e meio abalada:
_ Tá bom! Eu vou embora! Para de
bater em mim seu demônio! Inferno! Pelamor de Deus!
Hoje eu morro de rir quando me
lembro desse diálogo em que o demônio xingou o exorcista espancador de demônio
e ainda pediu auxílio ao divino.
Assim ia a conversa e quanto
mais incômoda ficava, mais extensa e tenebrosa.
Por fim, quando todos
perceberam que um dos colegas não se manifestava nem para contar um caso e nem
parecia se impressionar com as estórias, resolveram perguntar:
_E você fulano, cê acredita em
espírito?
_ Eu não. Respondeu seco e meio
incomodado com o assunto.
_ Uai, mas se um aparecer na sua
frente?
_ Peço licença e continuo
andando.
Todos estavam já pensando como ir
embora para casa naquela noite e na indolência do Fulano diante de um assunto
tão sério. E mais explicações e perguntas vieram:
_ Mas não é assim não
rapaz. Espírito quando aparece a gente não consegue fazer nada, ele passa entre
as coisas e segue o nosso pensamento; tipo no filme do Ghost.
Disse um dos garotos.
_ Duvido que cê faz alguma coisa.
Aí ele disse com toda seriedade e impaciência:
_ Uai, não faço nada mesmo não! E se aparecer pra mim eu
digo: Óh, eu não acredito no cê não. E eu não quero papo!
A essa altura estávamos todos sentados em uma roda e
instintivamente nos aproximávamos numa tentativa de proteção em bando. Por um
instante o silêncio tomou conta do ambiente. Todos ficaram calados. Foi aí que
de repente o maior moleque da turma, o Beltrano, levantou-se de sobressalto
assustado e gritando:
_ Olha o bicho aí!!!
O pavor foi geral. Não teve esse que ficasse parado. Eu senti
minha espinha gelar e nunca me levantei tão rápido em toda vida. A roda de
conversa se dissolveu e todos se afastaram do jeito que dava. Teve gente até
gingando capoeira contra o desconhecido.
Um segundo depois nos entreolhamos tentando entender o tinha
acontecido e vimos que o Beltrano já estava a um poste de distância ainda
correndo e se desviando da sua mãe que o caçava com uma vara de goiabeira.
_ Vem cá seu miserável! Não falei pra tá lá em casa antes do
seu pai chegar!
Olha que coisa, o tal bicho era a mãe dele enfurecida.
Ficamos meio constrangidos com a situação e já falamos de ir
embora para casa. Uns mais cruéis riam do Beltrano e só depois nos demos conta
da ausência do Fulano.
_ Uai gente, cadê o Fulano?
Pois então, o Fulano na hora da confusão desapareceu tão
rápido que ninguém viu nem a direção que seguiu. Quando nos encontramos com ele
no outro dia e perguntamos sobre o que ele tinha feito para sumir tão rápido
ele nada falava.
Claro que foi uma azaração gigante e de vez em quando a
gente o chamava de Noturno dos X-Men porque tinha a capacidade de se
teletransportar na hora do cagaço.
Ele nada dizia. Mistérios...
Pois bem caríssimos, outro dia me aventurei a assistir a tal
Rede Globo por alguns instantes. Vi um pouquinho de um programa chamado
Esquenta da Regina Casé, mas que se pronuncia Ixquenta, e um bloco inteiro do
Altas Horas do finado Sérgio Groissman. Digo finado porque me lembro dele no
Programa Livre e era muito melhor.
O tal Ixquenta é uma lástima porque fica numa tentativa
suicida de convencer as pessoas que favela é bom. Ou seja, o legal é ser da
comunidade. Uma pseudo-valorização da condição social do país e, lógico, o
oportunismo de se ganhar a audiência na chamada ascensão da classe C.
Já nos Altas Horas me dei conta de outro aspecto, a
necessidade de se filmar tudo. Tinha uma dupla sertaneja tocando e um grupo de
axé (daí se vê que eu assistia por curiosidade e mais nada).
Quando esses artistas começavam a tocar a plateia formada
por jovens ficava morta. A não ser pelo fato de instintivamente pegarem os telefones
e começarem a filmar. Não cantavam, não dançavam e só filmavam e faziam seus
selfies... Nós estamos ficando doentes com esses celulares. Parecia impossível,
mas essa geração consegue ser mais sem graça que a minha.
As pessoas perdem a sensação dos momentos e não aproveitam as
experiências porque estão preocupadas em botar o celular para filmar e no
enquadramento da imagem. Quanta memória jogada no lixo, já que esses vídeos certamente
nunca são vistos...
Sem contar o tal pau de selfie.
Ôh meu Deus! O mundo vai acabar logo, né?
Um sujeito saca sabe-se lá de onde um artefato retrátil, tipo antena de carro velho, encaixa o celular na ponta e faz uma foto de si e de suas companhias (aí é welfie).
No futuro haverá concurso do melhor pau de selfie. Imagina o vendedor do shopping Oi:
_ Aêêê o pau de selfie!!! Tem de todo tamanho minha senhora!
Pois é, acabaram com o pau de sebo e inventaram outro pau para diversão...
Para quem nunca viu dá uma olhada na sutileza aqui. Pau de Selfie
É ou não é demais???
No mais segue a vida.
O Cristiano Ronaldo foi escolhido o melhor do mundo;
Quanta bobagem essa eleição;
Haja vista a presença de David Luiz na zaga escolhida;
Ao Galo só falta os talheres, já que o Pratto está aí;
Que piada retardada, peço desculpas;
Para chocar um pouco:
Je suis Charlie!? Bem, eu não;
Fico muito mais preocupado com os 50 mil homicídios que
acontecem no Brasil por causas muito mais estúpidas;
Lá é um jornal desaforado que ganha a vida e dinheiro
fazendo charges ofensivas contra uma manada de idiotas fundamentalistas e
desumanos;
Não há mistério algum nessa charada;
Só a cretinice de pensar que todos precisam aceitar tudo e
do mesmo jeito;