Desabafo
de um ex-poeta
Levo-me
a crer que poesia tem data de validade na vida da gente. Uma chama que vai se
apagando, esperneando contra a mansidão, mas que enfim se apaga no jocoso
dia-a-dia. Será o fim da paixão? Uma completude de todas as coisas que
percebemos...
Tenho
saudades dos meus versos mais criativos, sobretudo dos despretensiosos. A mesma
saudade que sinto dos gols que fiz nas peladas da minha rua. Meu eu fica
orgulhoso com a plasticidade e a sinceridade deles, porém, já não os faço mais.
“Êh vontade de enlouquecer.”
Vontade
mesmo é a de agora, saudosa vontade. Os versos brotavam na madrugada, nas ruas,
nos beijos, nos cheiros e pulsavam nas veias. Os versos saltitavam num clímax
excitante. Dó tenho eu daqueles que jamais puderam sentir esse à flor da pele,
poetas inférteis que para a vida não desabrocharam. Passaram da hora como os
bolos de minha irmã, que inexplicavelmente murchavam e perdiam a chance única
que os tempos lhes deram para mostrar suas belezas ao mundo.
Hoje,
é tudo prosa em mim. Uma conversa longa de esquina que vai indo lesma e brocha.
Perder-se é mais fácil. É na verdade provável nessas prosas que sutilmente me
irritam. Antes eram poucas as letras e muito o dizer e o sentir. Agora é carta,
noticiário, rigidez de paletó e muita certeza.
“Tenho certeza de quase tudo que tenho
certeza.”
Outrora
livre dos impedimentos que não sei se me lançaram ou se pacatamente os aceitei.
Sou um poeta sonolento que perdeu na memória o estado do que o faz. Sou pedra.
Caneta e papel de pedras.
Ousaram
dizer, não sei quem, mas dito foi, que a sensibilidade é o moto perpétuo da
poesia. A capacidade de captar o que nos rodeia a vida e, quase sempre, nos
fogem aos olhos. Santo Deus, tenho olhado tudo no mais fino detalhe e
admiração. Prestado reverência a cada beleza deste mundo seco, ouvido a todos
os irmãos sem distinções e mais, tenho me postado em seus lugares no exercício
de abstrair-me em suas angústias. Li filosofias e tenho me adestrado no tato
com todos os seres. Esperançoso que não sou, nem um versinho tem me visitado
nessa língua morta chamada poesia.
JFCNeto
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